quarta-feira, fevereiro 25, 2009

esta noite não chove... II

o espelho trincado olhava para ela,
indagando e repetindo seus traços entrecortados pela rachadura.
procurava qualquer reação nela a partir daquela compenetrada,
fixa num pedaço em branco de papel.
nem sequer ela se movia,
era puro enternecimento perante o nada.


pensava em que aquele reflexo?


e aquele outro?


eles esperavam alguma lágrima lhe sair dos olhos,
mas tão crus que se encontravam só puderam esperar.

por que esta espera tem um gosto tão doce?

terça-feira, fevereiro 24, 2009

persefonificando


a sorte me espanta os nomes,
nomes que se dão às coisas cabíveis ao sentido humano,
às coisas que deveriam participar dos dias,
ainda que bem no íntimo.
mas em toda e qualquer medida, eu não me encaixo,
mesmo contando ser privilegiada pelos sangues azuis e retóricas finas,
sublime como o nascimento da deusa ou o delírio do diabo.
diferente,
como no silêncio, a vontade se
parafraseia e eu me calo
doente de amor.
remedio o veneno
com a introspecção.
nem a mim destranco a porta.

segunda-feira, fevereiro 23, 2009

baile dos simulacros


no sonho, a tua boca desenhava a minha em tons de desatenção. tu, que eram tantos, cego nos traços, fazias da minha saliva um canto para o rei do que é inefável, aquilo que me tirava o chapéu à dança. e as mãos, que eram ainda as tuas, faziam enlaçar outros dedos aos meus numa valsa dúbia entre as faces que me desconheciam e os poros que me alcançavam... e eram os teus sempre, curiosos de abstração. deixava-me aos olhos lançados feito modelo que pousa com um assombro leviano, um simulacro semivisível das coisas secretas de amor, ainda que fôssemos palpáveis para a conveniência do universo. e eu apreendesse tudo o que nos permitisse, tudo o que um beijo inquietasse.

o sonho soava uma promessa...

mas, eu, entidade desperta, como quem padece da memória, desfiz-me à aurora, logo surpreendida pelas tuas inexistências.